Antiga sede do Clube Mineiro de Caçadores no bairro Serra.
Fonte: APCBH/ASCOM

O Clube Mineiro de Caçadores atualmente se localiza na cidade de Santa Luzia. A imagem acima mostra a primeira Sede do Clube que se localizava no bairro da Serra, mais precisamente no local onde se encontra atualmente o Minas II e o bairro Ex-Caçadores, na divisa com o Parque das Mangabeiras.
Nessa imagem, datada do inicio dos anos 60 pode se ver além do referido Clube, o trecho final da Rua do Ouro, parte das calhas dos córregos da Serra e Mangabeiras e em segundo plano a Favela do Pindura Saia e as árvores que circundam a Caixa D'água do Cruzeiro, além de uma parte da capital. Os terrenos acima do Clube foram passados para a Ferrobel em 1961 e loteados poucos anos mais tarde para a abertura do bairro Mangabeiras. A expansão urbana obrigou o Clube a se transferir na década de 70 para uma Fazenda em Santa Luzia. Atualmente não se tem resquicio algum na região que remete à esse período, apenas o pequeno condomínio que existe na área anteriormente ocupada pelo Clube e que adotou o seu nome.

Retificação e canalização do Córrego do Acaba Mundo para um novo leito construído na Rua Professor Morais em 1930.
Fonte:APM

A Rua Professor Morais, pertencente a zona planejada de Belo Horizonte foi batizada pela CCNC como Rua Paraybuna e se estendia desde a Avenida do Contorno até o cruzamento da Avenida Afonso Pena, totalmente inserida no bairro dos Funcionários. A partir daí ela se transformava na Avenida Paraybuna, uma das vias que formavam as arestas chanfradas do primitivo Parque Municipal.
Alguns anos após a inauguração da capital a Avenida foi renomeada para Bernardo Monteiro, primeiro Prefeito da capital, uma das dezenas de renomeações que alteraram a toponímia de diversas ruas e avenidas da capital em homenagem aos primeiros políticos da infante republica¹.
Já o nome “Professor Morais” foi dado em homenagem a um advogado e professor que residiu na capital e foi fundador do Colégio Dom Viçoso¹². Com essa nova renomeação a Rua Paraibuna, que seguia a logica da toponímia da capital deixou de existir, mais ou menos no mesmo período em que foi suprimida a Avenida Paraúna.
A Rua Paraibuna inicialmente não havia sido planejada para comportar o canal de um curso d’água, no caso o Córrego do Acaba Mundo². Somente após o inicio das obras em 1894 é que a Comissão construtora resolveu adequar o curso do córrego à malha urbana da nova capital.

A retificação do Acaba Mundo na zona urbana já era uma obra planejada pela CCNC desde o inicio das obras da construção da capital. A Comissão foi extinta logo após a inauguração da capital e as obras do novo canal do Acaba Mundo interrompidas, como afirma o Prefeito Bernardo Monteiro em seu relatório de 1900:

“Resta por concluir o canal destinado à mudança do leito do Acaba Mundo, que parte da rua Grão Mogol suburbana e vai ao Parque. Esta obra, aliás necessária, foi iniciada pela antiga Comissão Constructora e está parada desde 1897, e della não poderá cogitar tão cedo”.

As obras ficaram interrompidas por duas décadas e só foram retomadas quando o desenvolvimento urbano começou a aumentar na década de 20, década em que se deu o primeiro remodelamento do espaço urbano de Balo Horizonte. O planejamento urbano, crucial para a concretização do Projeto da capital que nesse período se restringia a região central e os bairros Floresta e Funcionários e a uma pequena parte do Barro Preto, ocupada em grande parte por operários foi exercido com uma maior rigorosidade por parte do Poder Público que visava à expansão da malha urbana dentro dos limites da Avenida do Contorno.


A Rua Paraibuna assinalada nas Plantas de 1895 e 1928. Como se vê, na Planta de 1928 o curso d'água já se apresentava canalizado ao longo da rua, obra empreendida somente no ano seguinte.
Fonte: APCBH

Para possibilitar a urbanização e a continuidade do crescimento da malha urbana teve inicio na segunda metade da década de 20 a retificação e a canalização aberta do córrego do Acaba Mundo entre a Avenida do Contorno e o Parque Municipal. As suas águas foram desviadas para um novo canal construído na Rua Professor Morais, que passou a ter uma pista de cada lado do canal e Avenida Afonso Pena. A terra utilizada no aterramento do antigo leito era proveniente do desmonte do Morro do Cruzeiro, atual Praça Milton Campos. Com o aterramento do antigo leito tornou-se possível a construção e urbanização de 13 quarteirões compreendidos no bairro Funcionários e adjacências segundo a Planta Geral da capital.


Calçamento da Rua Professor Morais em 1929.
Fonte: APM


Pavimentação da mesma rua no cruzamento com a Rua Tomé de Souza.
Fonte: APM

A rua permaneceu até a década de 60 com o canal do córrego a céu aberto. No ano de 1963, devido ao aumento do fluxo viário na capital e o aumento da poluição das águas dos cursos d’água que atravessavam a região compreendida dentro dos limites da Contorno, uma consequência do vertiginoso crescimento urbano de Belo Horizonte à partir de 1950 toma-se a decisão de cobrir os cursos d’água de menor porte que atravessam a Zona Urbana, medida que resolveria momentaneamente o problema viário que já começava a surgir em várias partes da capital e esconderia a poluição que incomodava uma grande parcela dos moradores do bairro Funcionários.


Remoção da Alvenaria do Acaba Mundo entre a Avenida Getúlio Vargas e Rua Cláudio Manoel em 1963.
Fonte: APCBH/ASCOM


Obras de cobertura do Acaba Mundo no mesmo trecho da imagem acima.
Fonte: APCBH/ASCOM


Obras de cobertura no cruzamento com a Rua Antônio de Albuquerque.
Fonte: APCBH/ASCOM


Inauguração das obras de alargamento da Rua Professor Morais em 1965. É bom ressaltar que essa obra começou na gestão do Prefeito Jorge Carone Filho, cassado pela Câmara Municipal de BH em 1965, poucos meses após a Revolução de 64. Entre as autoridades está o Prefeito Oswaldo Pieruccetti, que assumiu a Prefeitura após a cassação de Carone.
Fonte: APCBH/ASCOM

Esta foi a ultima grande mudança na paisagem urbana da Rua Professor Morais, salvo a remoção do canteiro central na década de 90, que transformou a via em mão única visando a melhoria da mobilidade dentro dos limites da Avenida do Contorno. Nos últimos anos, devido a alta especulação imobiliária que atinge Belo Horizonte a rua está passando por uma nova reconfiguração urbana. As últimas casas residenciais, muitas contemporâneas a antiga configuração da rua estão sendo derrubadas para dar lugar aos edifícios comerciais. Com a cobertura do córrego do Acaba Mundo ele desapareceu da paisagem urbana e a identificação do seu traçado atualmente é possível apenas com a consulta as Plantas Cadastrais antigas e as Cartas Hidrológicas existentes, reforçado ainda pelo fato da Rua Professor Morais não ser de fato um fundo de vale³.


Rua Professor Morais no ano de 2007.
Fonte: Foto do Autor


Rua Professor Morais no ano de 2011, no cruzamento da Rua Antônio de Albuquerque.
Fonte: Foto do Autor


Imagem de Satélite onde se vê sinalizada a Rua Professor Morais nos dias atuais.
Fonte: Google Earth


¹ Esse “passo para a imortalidade” dado pelos primeiros representantes da municipalidade quase acabou com a formidável logica estabelecida pela CCNC em relação à topônimia da capital. Muitos nomes foram suprimidos posteriormente, visto o exagero cometido pelos governantes na década de 10 mas muitos nomes dados por eles permanecem inalterados até os dias atuais. Por ora não me estenderei nesse assunto, o abordarei em artigos posteriores.

¹² Dicionário Toponímico de Belo Horizonte, p.223.

² É bom lembrar que os cursos d’água que atravessam a Zona Urbana compreendida dentro do perímetro da Avenida do Contorno foram ignorados pela CCNC quando da confecção da Planta Cadastral da Nova Capital. Eles foram sendo ao longo das décadas retificados e canalizados de acordo com o traçado urbano de Belo Horizonte.

³ Ao contrario do que muitos pensam a Rua Professor Morais não é um fundo de vale, na verdade apenas uma parte da via era cortada pela calha original do Acaba Mundo. Na verdade ele corria no sentido da Rua Rio Grande do Norte, parte da Avenida Afonso Pena, Ruas Bernardo Monteiro e Aimorés até a Igreja da Boa Viagem.

Pedreira do Acaba Mundo em imagem de 1895.
Fonte: BARRETO, Abílio. Belo Horizonte: Memória Histórica e Descritiva, 1996.

    Quando a Comissão designada para a escolha do local onde se construiria a nova capital visitou os cinco locais previamente escolhidos um dos critérios analisados foi à existência de locais para o fornecimento do material necessário para a construção dos edifícios, do calçamento das ruas e avenidas e para a retificação dos cursos d’água visando o saneamento da região, uma das principais alegações dos partidários à mudança da capital de Ouro Preto.
  Os arredores do arraial de Belo Horizonte poderiam fornecer em larga escala uma grande parte do material necessário para a edificação e o embelezamento dos prédios públicos que seriam construídos¹ com um custo reduzido, pois as pedreiras que forneceriam esse material se encontravam a uma pequena distancia do local onde se edificaria a nova capital.
   Na construção da capital foram utilizados materiais oriundos de cinco pedreiras, a saber: Acaba Mundo, Pedras ou Morro das Pedras, Viação (Prado Lopes), Lagoinha e Carapuça, todas utilizadas como marcos da rede de triangulação geodésica que estabeleceu a posição do sitio da nova capital. Para o transporte do material extraído das pedreiras foi construído um pequeno ramal ferroviário desde a Praça da Estação até as pedreiras exploradas, passando pelos principais locais onde se empregava o material transportado.
A Pedreira do Acaba Mundo se localizava no sopé da Serra do Curral, nas proximidades da Praça JK e acima do Aglomerado de mesmo nome, na região sul de Belo Horizonte².


Trecho do Ramal do Acaba Mundo que transportou grande parte do material empregado no embelezamento dos edifícios da Praça da Liberdade.
Fonte: BARRETO, Abílio. Belo Horizonte: Memória Histórica e Descritiva, 1996.


Pedreira do Acaba Mundo em 2008.
Fonte: Google Earth

    A Pedreira Prado Lopes ficava nas proximidades da região da Lagoinha, bem próximo ao centro da capital. O seu entorno abriga um dos aglomerados mais antigos de BH: o Aglomerado Prado Lopes, que herdou o nome de um dos seus arrendatários no período em que ainda era explorada. A Pedreira da Lagoinha ficava exatamente em frente a Prado Lopes e atualmente abriga parte do bairro Concórdia.


Pedreiras Prado Lopes e Lagoinha em imagem de 2008.
Fonte: Google Earth

    O Morro das Pedras se localiza na vertente do Córrego das Piteiras, logo atrás do Hospital Madre Tereza e suas terras atualmente encontram-se totalmente ocupadas pelo Aglomerado Morro das Pedras. Segundo o relatório do Prefeito Chrstiano Machado datado de 1926 essa Pedreira era a mais rentável para a Prefeitura devido a excelente qualidade das pedras para a fabricação de meios fios e paralelepípedos. É bom explicar que nesse período todas as Pedreiras pertecentes a Prefeitura estavam arrendadas a terceiros.


Morro das Pedras no ano de 2008.
Fonte: Google Earth

    A Pedreira da Carapuça³ situava-se na região leste da capital mineira, às margens da antiga estrada que ligava Belo Horizonte à Nova Lima e Sabará. Partes das suas terras estão atualmente ocupadas pelo bairro Pompéia e pelo Aglomerado São Rafael.
    Nas décadas seguintes a inauguração de Belo Horizonte as pedreiras continuaram a ser exploradas, umas pelo governo e outras por particulares. Uma delas, a Pedreira da Viação passou a ser explorada pelo engenheiro Antônio do Prado Lopes Pereira no inicio do Século XX.


Pedreira do Carapuça, às margens do Arrudas em imagem de 2008.
Fonte: Google Earth

    A Pedreira do Acaba Mundo forneceu grande parte do calcário empregado no embelezamento de vários edifícios públicos e particulares da capital mineira. No inicio da década de 50 passou a ser extraído o dolomito com a finalidade de ser empregado na siderurgia. Essa exploração perdura até os dias atuais.
   As Pedreiras da Lagoinha, Morro das Pedras e Carapuça também forneceram material empregado no calçamento da capital durante décadas. Com o crescimento urbano elas foram sendo desativadas ao longo das décadas.


Pedreira Prado Lopes no inicio da década de 40, quando da abertura da Rua Pedro Lessa na gestão JK.
Fonte: APCBH Relatório do Prefeito Juscelino Kubitschek de Oliveira, 1941.


Parte da Pedreira Prado Lopes nos anos 40, com a reocupação da área pelos antigos moradores que haviam sido removidos em 1940.
Fonte: BH Nostalgia


Pedreira do Acaba Mundo em imagem datada do inicio dos anos 60.
Fonte: Acervo IBGE

    Uma característica que se observa nas pedreiras Prado Lopes, Carapuça e Morro das Pedras é que todas abrigam há algumas décadas aglomerados, na sua maioria oriundos de outras regiões da capital e que foram “empurrados” para esses locais, exceção à Prado Lopes que existe desde o inicio da década de 30. Esse aglomerado foi removido durante a gestão JK, mas voltou a ser formar na segunda metade da década de 40 nas duas metades da pedreira divididas pela Rua Pedro Lessa.
    Já o aglomerado do Acaba Mundo se formou um pouco abaixo da Pedreira atualmente desativada, ao longo do córrego de mesmo nome, enquanto a exploração passou a ocorrer acima da primeira cava. Toda a ocupação que se verifica nas áreas das antigas pedreiras e no seu entorno ocorreram devido à expansão desordenada de Belo Horizonte. Geralmente as pedreiras são exploradas a certa distancia dos centros urbanos e por questões de segurança e de salubridade as terras no entorno das pedreiras são vedadas à ocupação urbana. Com o crescimento desordenado que sempre caracterizou a expansão urbana de Belo Horizonte além da expulsão dos moradores de baixa renda das áreas mais próximas ao centro essas terras no entorno das Pedreiras foram sendo sistematicamente ocupadas estrangulando aos poucos a área das pedreiras, restringindo-as ao local explorado. Naturalmente o uso de explosivos e a britagem da rocha, entre outras coisas passam a afetar os moradores do entorno da Pedreira instaurando-se então um conflito social que geralmente é resolvido com o fechamento da pedreira. Atualmente pode-se observar que as pedreiras que abastecem a capital se localizam ao longo da RMBH. E as áreas das antigas pedreiras (não só as cinco pedreiras abordadas nesse artigo, mas sim todas as outras também desativadas atualmente) se encontram totalmente inseridas à malha urbana de Belo Horizonte, sendo quase impossível identifica-las em alguns trechos por causa do adensamento urbano.


Pedreira do Acaba Mundo e ao fundo a área explorada atualmente.
Fonte: Nelson CLM/Panoramio


Parte da Pedreira Prado Lopes nos dias atuais (2012).
Fonte: Foto do Autor


Pedreira da Lagoinha e parte do bairro Concórdia.
Fonte: Foto do Autor


Parte do Morro das Pedras nos dias atuais.
Fonte: Foto do Autor


Pedreira do Carapuça escondida pelo Aglomerado São Rafael.
Fonte: Foto do Autor


Imagem de Satélite onde estão assinaladas as cinco pedreiras que existiam nas proximidades da Zona Urbana de Belo Horizonte.
Fonte: Google Earth


¹ O Complexo Belo Horizonte que domina grande parte do território que compõe a capital mineira é o responsável por grande parte do material fornecido pelas antigas pedreiras, o granito gnaisse. Já a Pedreira do Acaba Mundo, situada a meia cota da Serra do Curral forneceu durante muitas décadas o calcário utilizado em diversas construções da capital. Desde a década de 50 ela fornece o dolomito utilizado em diversas siderúrgicas do Vale do aço.

² O antigo ramal do Acaba Mundo seguia desde a Praça da Liberdade até a dita pedreira pela Estrada do Acaba Mundo (hoje Rua Major Lopes, parte da Avenida Uruguai, Rua Califórnia e Rua Correias).

³ Segundo Abílio Barreto, em sua “Memória Histórica”, existia no final do Século XIX uma pedreira denominada “Cardoso”, em frente ao Carapuça. Segundo o mesmo autor, a sua exploração foi descontinuada ainda no período da construção da capital. Provavelmente ela existiu em algum local atualmente ocupado pelo bairro de Santa Teresa, visto que atualmente é impossível localizar com exatidão a sua localização.

Armazéns da Esso no inicio da década de 1950 segundo o IBGE. Ao fundo as Vilas Cachoeirinha e Ipiranga.
Fonte: Acervo IBGE

   Os armazéns da Esso se localizavam às margens do antigo ramal da Central do Brasil que tinha origem no Horto, ao lado das Oficinas da Central. O ramal, que também transportava passageiros atendia ao Matadouro no bairro São Paulo e da Rua Jacuí, que integrava a antiga estrada municipal que dava acesso a Santa Luzia e ao Matadouro. Na imagem acima se pode ver além dos armazéns o Córrego da Cachoeirinha em seu leito natural, atualmente canalizado e a Vila de mesmo nome, além da Vila Ipiranga, situada à esquerda na parte superior da imagem. É interessante observar que a Rua Jacuí configura-se como o único acesso dessa porção da capital com a região central no período abordado. Ela fazia parte de uma rede de estradas municipais que partiam da região central e que foram ao longo das décadas absorvidas pelo constante crescimento da malha urbana de Belo Horizonte se transformando, em alguns casos em vias locais, atendendo aos bairros que nasceram no seu entorno.
   Já o ramal férreo que partia das oficinas da Central, ainda existentes no bairro do Horto desapareceu em 1969, por ser considerado antieconômico e o seu leito hoje se encontra em grande parte absorvido pela malha urbana, com exceção de um pequeno trecho utilizado pelo Metrô.
  Outro fato que chama a atenção do observador é a presença de uma propriedade rural à esquerda dos armazéns, remanescente da antiga zona rural de Belo Horizonte destinada ao seu abastecimento, cuja casa ainda existe, com algumas modificações. Essas propriedades, com a expansão urbana da capital foram sendo gradativamente fragmentadas e loteadas, dando origem a diversos bairros que circundam a Zona Urbana – leia-se Avenida do Contorno, da capital.


Rua Jacuí, antiga estrada municipal que dava acesso a Santa Luzia e posteriormente ao Matadouro sinalizada em parte da Planta de 1922.
Fonte: PANORAMA de Belo Horizonte; Atlas Histórico. Belo Horizonte: FJP. 1997.


Armazéns da Esso em destaque no mapa de 1955. Em vermelho pode-se ver algumas das antigas estradas municipais.
Fonte: Acervo do Autor


Os armazéns sinalizados na Planta Cadastral de 1954.
Fonte: PANORAMA de Belo Horizonte; Atlas Histórico. Belo Horizonte: FJP. 1997.

  Com a construção do Túnel da Lagoinha e a abertura da Avenida Cristiano Machado na década de 70 toda essa extensão de terras foi rapidamente absorvida pela malha urbana de Belo Horizonte. É bom lembrar que essa região no período abordado era considerada pelo Poder Publico prioritária para a expansão da capital. A abertura da avenida fragmentou a Rua Jacuí, que foi cortada pela nova via.
  Atualmente grande parte dos terrenos do antigo armazém estão ocupados por uma concessionaria de automóveis. A profunda mudança espacial ocorrida nas ultimas décadas erradicou totalmente da paisagem qualquer resquício do armazém que existiu ali, assim como grande parte das vias de acesso que levavam a ele, exceção a Rua Jacuí que ainda desempenha um papel importante de ligação entre os inúmeros bairros que compõem o seu entorno com a região central de Belo Horizonte.


Antigo leito do ramal da E.F.C.B. sinalizado na imagem acima. Em destaque está uma parte da Rua Jacuí que desapareceu quando da abertura da Avenida Cristiano Machado em 1971.
Fonte: Google Earth

Imagem de Satélite onde está destacada a área dos antigos armazéns.
Fonte: Google Earth

Algumas imagens da região central de Belo Horizonte atingidas pelas chuvas na Avenida Afonso Pena e Rua Acre em 1963. Na imagem inferior direita é possível visualizar a ponte sobre o Arrudas construída em 1940 na gestão JK.
Fonte: APCBH/ASCOM

    Belo Horizonte, por estar assentada sobre mais de 700 km de cursos d’água, sejam eles em curso aberto ou fechado sob as vias, sempre sofreu com as inundações nos períodos chuvosos. Existem relatos, desde o final do Século XIX sobre os estragos causados pelas cheias dos córregos, em particular o Córrego do Acaba Mundo que atravessava o centro do arraial do Curral Del Rey¹.
  Deve-se entender a diferença entre uma inundação em áreas onde a ação antrópica não interferiu profundamente na paisagem e a inundação em cidades de médio e grande porte, como Belo Horizonte. A destruição em áreas urbanas é bem elevada em relação às inundações em áreas rurais e pequenos núcleos urbanos.
    O acelerado crescimento urbano da capital agravou ainda mais os problemas causados pelas enchentes, a impermeabilização do solo e a ocupação desenfreada das vertentes², das várzeas e dos fundos de vale aumentou ainda mais o poder de destruição das águas.
  Os canais dos cursos d’água já canalizados, como o Acaba Mundo e o Leitão por exemplo foram alargados quando da cobertura do seu curso com a remoção da alvenaria de pedra rejuntada das paredes do canal. Mas o alargamento não acabou com as enchentes e periodicamente as águas, que continuam seguindo o seu curso natural em direção à drenagem principal – no caso os Ribeirões Arrudas e Onça, transformam as ruas e avenidas existentes sobre os córregos em verdadeiros rios, como se vê nos vídeos abaixo.


Enchente do Córrego dos Pintos canalizado sob a Rua Platina nas chuvas de 2010.
Fonte: BRAlexSilva/Youtube


Enchente na Avenida Silva Lobo, na altura do bairro Calafate.
Fonte:diegotadeu76/Youtube


Trabalhos de remoção da alvenaria das laterais do Córrego do Acaba Mundo na Rua Professor Morais em 1963 com a finalidade de alargar a sua calha que posteriormente foi coberta para a melhoria do fluxo viário.
Fonte: APCBH/ASCOM


Obras de cobertura do Córrego do Leitão em 1970 no cruzamento da Avenida Bias Fortes e Rua Mato Grosso. À direita do canal pode-se ver a desembocadura do Córrego da Barroca. Esse trecho atualmente apresenta ocorrências de alagamento nos períodos chuvosos.
Fonte: APCBH/ASCOM

   O Ribeirão Arrudas, mesmo canalizado desde a década de 20 periodicamente continuou saindo do seu leito, ocupando a sua várzea - leiam-se Avenidas do Contorno e dos Andradas e os quarteirões existentes ao longo das Avenidas, causando grandes estragos para a população³ e prejuízos para o Poder Público. Com o constante crescimento da capital aliada à impermeabilização do solo as águas passaram a correr com mais velocidade, chegando ao mesmo tempo ao longo do ribeirão³¹ aumentando cada vez mais o seu poder de destruição. Quem tem mais de trinta anos certamente se lembrará das tragédias que ocorriam com freqüência nos períodos chuvosos, em particular as regiões atravessadas pelo Arrudas fora da Zona compreendida dentro da Avenida do Contorno e pelo Ribeirão do Onça.


Enchente do Ribeirão Arrudas na região central em 1947.
Fonte: Desconhecida


As imagens acima retratam a destruição causada pelas enchentes ao longo dos anos 60. As duas imagens no alto mostram a Avenida Afonso Pena em frente ao antigo DOPS e o Córrego do Acaba Mundo no Parque Municipal. Abaixo delas pode-se ver o Ribeirão Arrudas na Avenida do Contorno.
Fonte: APCBH/ASCOM

   A partir da década de 70 ficou evidente que a canalização empreendida nas décadas de 20 e 30 já não era suficiente para dar a vazão as águas que a cidade necessitava. Em 1975 foi elaborado pelo PLAMBEL um plano para a melhoria da drenagem na região central. Corroborando o que foi dito acima, entre outras coisas o relatório afirmava que,

“é fácil verificar que a urbanização ocorrida na bacia do Arrudas foi superior à prevista na época da construção do canal. Assim, as vazões máximas às quais está sujeito o canal ultrapassam a capacidade de escoamento. Isto deve-se, em primeiro lugar, ao fato de que havendo maior área urbanizada, há maior área impermeável: em segundo lugar, ao fato de que o aumento do índice de impermeabilização e de canalização na bacia, provoca a diminuição de seu tempo de concentração e eleva as vazões de pico”. (Plambel, Drenagem Urbana na área Central, 1975).

   Outro fator apontado pelo Plambel era a deficiência das redes coletoras existentes e mesmo a faltas delas em alguns pontos da capital. Esse escoamento precário persiste até os dias atuais, e as águas pluviais todos os anos proporcionam o mesmo espetáculo da transformação de ruas e avenidas em verdadeiros rios.
Voltando ao caso do Arrudas: para tentar minimizar o problema a Prefeitura demoliu diversas pontes que estrangulavam o ribeirão em vários trechos da capital. Essa medida melhorou sensivelmente o escoamento das águas, não resolvendo o problema das inundações.
   Na década de 80 iniciam-se as obras de alargamento do canal do Arrudas no trecho compreendido entre a Avenida Tereza Cristina e a Ponte do Perrela. Posteriormente a canalização foi estendida a montante até o cruzamento da Avenida Amazonas na Gameleira e a jusante desde a Avenida do Contorno até a Avenida Silviano Brandão, na confluência com o córrego da Mata. A canalização do Arrudas e a urbanização do seu entorno extinguiu diversas favelas que existiam ao longo do seu curso e que sofriam com as cheias do ribeirão.


Final da antiga canalização do Arrudas em 1983 na Ponte do Perrela. Ao lado da ponte é possivel ver os emissários de esgotos construídos nas décadas de 1910 e 1920 que despejavam os esgotos da capital in natura no ribeirão. A imagem data do inicio de 1983 após a grande enchente de 02 de Janeiro de 1983 que arrasou com a antiga ponte da Avenida do Contorno.
Fonte: Acervo Plambel


Favelas da Baiana e União que se localizavam às margens do ribeirão. Elas se localizavam em parte da área hoje ocupada pelo Boulevard Shopping.
Fonte: Acervo Plambel


Mapa confeccionado pelo Plambel onde está sinalizado em vermelho as áreas atingidas pela enchente de 1983. A área acima corresponde as Favelas citadas na imagem acima. As águas do Arrudas, canalizadas até as proximidades das Favelas aumentaram ainda mais o poder de destruição.
Fonte: Acervo Plambel


Ônibus arrastado para dentro do Ribeirão Arrudas na enchente de 1983, nas proximidades da Avenida Barbacena.
Fonte: Acervo Veja

    Na década de 90 a canalização foi estendida desde a Gameleira até as proximidades da confluência do Córrego do Ferrugem, uma das principais drenagens da cidade de Contagem. A canalização desse trecho foi sub-dimensionada sendo as enchentes freqüentes até os dias atuais. Com a canalização grande parte dos problemas decorrentes da precária urbanização que existia ao longo do ribeirão foi resolvida, porém um possível erro ocorrido ao se calcular a vazão do ribeirão nos períodos chuvosos é aceitável.
  É importante ressaltar que nessa intervenção foram removidos do entorno do ribeirão diversos aglomerados e desapropriadas uma grande quantidade de imóveis ribeirinhos. O grau de urbanização das vertentes do ribeirão, além dos córregos do Cercadinho, Bonsucesso e Ferrugem entre os anos de 1996 e 1998 quando foi empreendida a vultosa obra já era notória e certamente poderia ter sido dada uma maior atenção a essa urbanização devido a grande impermeabilização das vertentes que escoam com rapidez as águas para o ribeirão. A canalização do Arrudas na região do Barreiro e o crescimento urbano também contribuíram para o aumento da vazão do ribeirão.
   Uma coisa deve ser lembrada: as áreas mais baixas e os fundos de vale sempre estarão sujeitas às inundações devido ao caminho natural das águas. Os Engenheiros sempre procuram impor um limite para os cursos d’água que atravessam o meio urbano. Mesmo canalizados ou cobertos os córregos³² e os ribeirões em algum momento desconhecerão os limites impostos pelos homens, suas águas vão reivindicar o que é seu por direito e a população continuará pagando o preço pelo mau planejamento por parte do Poder Público. E, infelizmente a tendência é só piorar, pois com o constante crescimento urbano de Belo Horizonte a impermeabilização é cada vez maior, o calor é cada vez maior e a evaporação também é maior, ou seja, as probabilidades de temporais mais frequentes na capital só irá aumentar nos próximos anos caso não se tome medidas necessárias e não tão complexas para melhorar o escoamento das águas e permitir uma maior penetração no solo.


Ribeirão Arrudas nas chuvas de 1987 no local em que está sendo coberto o ribeirão para a execução da 3ª etapa do Boulevard Arrudas.
Fonte: Acervo Manuelzão e Corpo de Bombeiros


Córrego do Ferrugem no ano de 2011 em dois momentos distintos: à esquerda ano mês de Setembro com sua vazão mínima e no mês de Novembro com a sua desembocadura obstruída devido a elevação das águas do Arrudas.
Fonte: Foto do Autor


A confluência dos dois cursos d'água também no mesmo período da imagem acima.
Fonte: Foto do Autor


Córrego do Bonsucesso com a sua vazão normal e à direita represado devido ao aumento do volume d'água do ribeirão Arrudas.
Fonte: Foto do Autor


Córrego do Cercadinho na altura da confluência com o Ribeirão Arrudas em 2011.
Fonte: Foto do Autor


Córrego do Acaba Mundo em 1999 na Rua Grão Mogol.
Fonte: Foto do Autor


Ribeirão Arrudas nas chuvas de 2002 na altura do cruzamento das Avenidas do Contorno e Barbacena. Nesse mesmo local acaba de ser finalizada a segunda etapa do Boulevard Arrudas.
Fonte: Foto do Autor


Enchente do Arrudas na Avenida Tereza Cristina na virada de 2008/2009.
Fonte: Portal UAI/EM


Enchente na Avenida Silva Lobo. Sob a Avenida está o Córrego das Piteiras.
Fonte: Desconhecida


Ribeirão do Onça nas chuvas de 2010, na altura do bairro Ribeiro de Abreu.
Fonte: Portal UAI/EM


Enchente do Ribeirão do Onça na Avenida Cristiano Machado em 2010.
Fonte: Portal UAI/EM



Cheia do Ribeirão Arrudas nas chuvas de Dezembro de 2011.
Fonte: Foto do Autor


* Impressiona o pesquisador a falta de critério em relação aos nomes dos cursos d’água da capital. Com exceção dos córregos que atravessam a área planejada dentro dos limites da Avenida do Contorno os outros cursos d’água existentes, na sua maioria, constam nas cartas confeccionadas pela Prefeitura como “sem nome” ou com os nomes trocados. Muitos deles aparecem com dois ou três nomes ao longo do seu curso, adotando sempre o nome das ruas ou avenidas que existem sobre ele. Se o curso d’água não deixou de existir não justifica, propositalmente, trocar o seu nome ou simplesmente esquecê-lo, lembrando que grande parte das denominações dos córregos foram dadas há pelo menos cento e cinquenta anos, em conformidade com a tradição portuguesa na escolha dos nomes (Toponímia). Atualmente se encontram disponibilizadas em meio digital as cartas e plantas cadastrais de Belo Horizonte, inclusive as confeccionadas pela Comissão Construtora no final do Século XIX. Isso facilitou o acesso a estes documentos evitando assim algumas burocracias perante os órgãos detentores das plantas e cartas citadas. Poucas horas de pesquisa são suficientes para corrigir todos os lamentáveis equívocos que se vê nas cartas atuais das sub-bacias de Belo Horizonte e região.

¹ Uma dessas enchentes data de 09 de Janeiro de 1900 na qual se registraram diversas mortes e desabamentos causados pelo aumento do nível das águas dos cursos d’água. Diversos curralenses que foram testemunhas dessa enchente afirmaram na época que nunca viram uma enchente dessa magnitude no arraial. As fotos publicadas no decorrer do artigo são uma pequena parte das inúmeras inundações que atingiram (e ainda atinge) Belo Horizonte ao longo das décadas.

² Belo Horizonte apresenta algumas características físicas que aumentam ainda mais a velocidade e o poder de destruição das águas: suas vertentes apresentam na sua maioria uma grande declividade. Mesmo profundamente modificadas pela ocupação urbana e abertura de vias algumas dessas vertentes ainda apresentam declividades consideráveis; o bairro Santo Antônio, localizado na margem direita do córrego do Leitão e o bairro Grajaú, localizado na margem direita do córrego das Piteiras são bons exemplos dessa declividade que existe em várias regiões da capital. As alterações morfológicas do terreno promovidas pelo homem não amenizou os problemas causados pelas enchentes, na verdade essas alterações modificaram profundamente o curso natural das águas, a meu ver as tragédias que se vêem todos os anos em Belo Horizonte só têm um culpado: as sociedades modernas, que ainda não aprenderam (ou desaprenderam) a conviver em harmonia com o meio.

³ Segundo alguns relatos, nas enchentes desciam pelo ribeirão na região central desde geladeiras, sofás, até toras de madeira e latas de óleo carregadas dos postos de gasolina da Avenida do Contorno.

³¹ É sempre bom lembrar que os Ribeirões Arrudas e do Onça são as principais drenagens de Belo Horizonte. A quase totalidade dos cursos d’água existentes na capital vertem para esses dois cursos d’água.

³² Ainda veremos por muitos anos a Avenida Prudente de Morais e Rua São Paulo (Leitão), Avenida Francisco Sá e Rua Jaceguai (Pintos), Avenida Silva Lobo (Piteiras) Avenida Tereza Cristina (Arrudas) se transformarem em verdadeiros rios nos períodos chuvosos, que na verdade correm por baixo dessas vias construídas nos fundos de vale da capital. Citei apenas uma pequena parte dos cursos d’água de Belo Horizonte, existem muitos outros espalhados (e enterrados) pela capital que também se transformam em verdadeiros rios nesse período.

Rios Invisíveis da Metrópole Mineira

gif maker Córrego do Acaba Mundo 1928/APM - By Belisa Murta/Micrópolis